Pierrot e Arlequim
Aqui estou eu a escrever o meu primeiro texto! Já há muito tempo que venho falando a alguns amigos desta Peça de Teatro, por várias motivos... o ensinamento que cada um deve tirar dela, é de cada um.
A verdade é que muitas vezes as pessoas se esquecem de coisa muito básicas, das coisas que são realmente importantes e quando querem voltar atrás, quando querem fazer o que não fizeram, o que não disseram ... ups... já era.
Acima de tudo devemos sempre experimentar as coisas até ao limite (e cada um tem o seu limite).
Não devemos ficar com as dúvidas: Vale a pena ou não? Devo ou não viver isto? Devo falar? Devo dizer o que sinto? Se não experimentarmos nunca vamos saber, e se chegarmos ao fim e acharmos que não valeu a pena, ao menos vamos ter essa certeza. As dúvidas são o que nos mata...
Viver não é fácil, mas o ser humano tem tendência a complicar as coisas ainda mais.
Espero que gostem e que tenham uma boa reflexão
Já alguém viu um Pierrot ou um Arlequim que fossem casados?
Ninguém podia ver, porque ambos morreram solteiros.
O Pierrot nunca perdeu aquela mania de andar sempre metido consigo, e o Arlequim que já tinha 37 mil histórias por cima das 37 mil histórias que já tinha, o tempo foi passando e eles sempre na mesma, até que um dia acabou-se o tempo que cabia a cada um.
Depois os amigos do Pierrot e do Arlequim foram fazer-lhe uma visita ao cemitério. As suas covas eram ao lado uma da outra e à cabeceira de cada um tinha um cipreste; mas a árvore, em vez de lhes fazer companhia dava ainda mais a impressão do seu completo isolamento.
E enquanto os amigos caíam em meditação, começou inesperadamente este diálogo.
Arlequim: Ouve, ouve Pierrot!
Pierrot: O que há ainda?
Arlequim: Ouve: tive uma ideia!
Pierrot: Mais uma ideia?
Arlequim: Sim, sim! Chegou agora mesmo!
Pierrot: Não achas que chegou tarde?
Arlequim: É porque tu não sabes a ideia que é!
Pierrot: Tinha-te escapado essa!
Arlequim: É verdade. E é a melhor de todas! Até estou admirado como não a tive há mais tempo! Queres ouvi-la?
Pierrot: Escuta, Arlequim!
Arlequim: O que foi?
Pierrot: Tive uma ideia!
Arlequim: Não, espera um pouco: deixa-me contar primeiro a minha.
Pierrot: Não, não pode ser! Primeiro conto eu.
Arlequim: Quem teve primeiro a ideia fui eu!
Pierrot: Ah, vê-se mesmo que não sabes qual a ideia que eu tive agora mesmo! Senão não falavas da mesma maneira…
Arlequim: Oh, e se tu ouvisses a minha!
Pierrot: Não pode haver comparação!
Arlequim: Isso mesmo digo eu!
Pierrot: Eu não tenho forças p’ra escutar a tua sem te ter dito a minha!
Arlequim: É o que acontece comigo.
Pierrot: Tanto pior para ti!
Arlequim: É impossível haver uma ideia mais genial que a minha!
Pierrot: Oh, e a minha!
Arlequim: Somos capazes de ter tido a mesma ideia!
Pierrot: Oh, não, é impossível! Vais ver: eu conto-te a minha, e a tua fica logo a perder de vistas.
Arlequim: Não digas fantasias! Tu lá sabes o que me veio à cabeça!? Digo-te mais: é o suficiente pr’a voltar o mundo inteiro de pernas para o ar!
Pierrot: Ora aí está! Afinal sou eu que tenho razão: tu precisas de ouvir primeiro que tudo a minha ideia.
Arlequim: Mas porquê?
Pierrot: Pois tu acabas de dizer que a tua ideia faz voltar o mundo de pernas para o ar: tens que ouvir primeiro a minha ideia.
Arlequim: Bom: conta-a lá, mas depressa!
Pierrot: A minha ideia é esta: pedir-te pr’a que não digas a tua ideia.
Arlequim: Ora essa. Porquê?
Pierrot: Pensa porque será.
Arlequim: Não sei porquê.
Pierrot: Então eu digo-te: porque tu e eu, nós os dois, já não existimos. Ambos nós morremos e estamos aqui enterrados os dois, cada um na sua cova, e tão sós como o estivemos na vida. Ouviste bem? A morte já veio ter connosco, e ela é como tu dizias da vida: é só uma. Agora já não há ideias que nos valham! Acabou-se tudo: o que foi feito e o que não foi feito!
Arlequim: O que não foi feito?
Pierrot: Sim. O pior não é o que fizemos, é o que não fizemos!... E agora já é tarde, muito tarde! Estás a ouvir?
Arlequim: É verdade! Acabou-se tudo!... E ia tudo tão bem desta vez! Tu não imaginas que genial era a minha ideia!
Pierrot: Escapou-se essa! Tu não dizias que a vida era só uma, e que havias de espremê-la muito bem espremidinha até ao fim?
Arlequim: Escapou-me a melhor de todas!
Pierrot: Tem graça, não tem? Ter escapado a melhor de todas!
Arlequim: Dou-te a minha palavra de honra que era a melhor de todas!
Pierrot: Escusas de me dar a palavra de honra, porque sei que dizes a verdade. Também a mim me escapou a melhor de todas!
Arlequim: Tem graça a ti também?
Pierrot: É verdade a mim também.
Arlequim: Não há dúvida: agora já é tarde.
Cai o pano para sempre.
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